Camila
Alexandrini
“É frustrante.”// “Não é uma leitura que me
prende.”// “É desinteressante.” // “Esse não é o livro que eu esperava ler.” //
“É bem escrito, mas não gosto.” // “Ganhou muitos prêmios.” // “Falta
literatura.”
Em nosso grupo
de pesquisa, o qual se aprofunda especificamente na literatura contemporânea
brasileira, tem sido recorrentes tais comentários sobre as leituras que fizemos
nesse ano de 2015 [Sérgio Y. vai à
América (2014), Minha vida sem banho (2014),
O evangelho segundo Hitler (2015)]. É
evidente que não são unânimes, mas são insistentes. Como leitores assíduos da
literatura que aqui se faz e pesquisadores inteiramente interessados nos
movimentos e nas nuances do contemporâneo, cabe a nós também pensar o que fazer
com eles. Não é recente o desconforto (de várias feições) com as novas formas e
os limiares entre um fazer e outro, um tempo e outro, mas parece urgente a
necessidade de compreensão e revisão contínua das ferramentas que nos utilizamos
para nos adentrar na literatura – ou para nos escapar daquela que se
estabeleceu sob conceitos fundantes.
Já apontava
Maurice Blanchot que a literatura encaminha-se ao fim e, aos seus eternos
amantes, cabe o desejo de redescobri-la continuamente. Da mesma forma, nessa
estranha instituição, a literatura, como afirma Jacques Derrida, produz-se um
traço sempre paradoxal: a lei que constitui é nela mesma contestada. Talvez o
que esteja acontecendo são as artimanhas próprias do contemporâneo, em que a
profanação ilumina o passado sem se ater. Esperávamos talvez o passado atado, o
deleite e o gozo com o qual a literatura se identifica, ou ainda, que a sua
desconstrução pudesse revelar-se com garras menos conhecidas por nós, leitores
exigentes. Perguntar-se o que é
literatura tem sido nossa tautologia preferida, e sim, há prazer em não
saber, em dizer sempre o mesmo de formas cada vez mais inesperadas. É preciso,
contudo, mais do que isso. É necessário que nos lancemos à literatura munidos
de outros mecanismos de leitura, de outras expectativas teóricas, de um estar
disposto à performatividade que o contemporâneo nos coloca.
“É difícil talhar esse objeto que é invisível
e impalpável.” // “A literatura é uma vaca que mia”. // “A literatura é voar
fora da asa.” // “Literatura é o
encontro entre precariedades." // “A literatura é liberdade.” // A literatura é humana e é a leitora de mim.
Na
literatura, tudo está por dizer. Resguardamos nela o imperativo de nossos dias,
e as tentativas de identifica-la serão sempre frustradas (ou frustrantes). A
não essência da literatura nos leva a outros discursos, à busca de sua potência
revelada em outros objetos e formas. Como uma performance inaugural, de acordo
com Derrida, que reconstrói seu leitor a partir do sim que ele lhe oferece, a literatura contemporânea parece estar à
espera de uma experiência renovada – de escritores e leitores – em que, desafiando
sua própria escritura e instituição, ela possa ser novamente subversiva e
indisciplinar.
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